A Palavra não é apenas código, é Liberdade!
- Ricardo Moutinho
- 8 de abr. de 2017
- 3 min de leitura
A Palavra não é apenas código, é Liberdade! A Escrita enquanto meio de criação, é também um meio de nos expressarmos livremente, quer para nós mesmos, enquanto veículo de reflexão para criação de sentidos, subjectividades e objectividades, assim como para com os outros, como veículo de relação, aqui quase sempre de forma subjectiva, dado que é interessante reparar que as percepções tiradas destas relações acabam por ser singulares, mesmo que as pessoas que se relacionam pela criação escrita estejam vivendo o mesmo acontecimento ou criação.
A escrita enquanto meio de relação permite esta subjectividade quer na percepção dos sentidos, quer na percepção temporal, já que a escrita permite uma elevação acima do tempo, permitindo que as pessoas que se relacionam através desta, enquanto escritor e leitor, possam relacionar-se dentro do mesmo acontecimento em pontos diferentes definidos cronologicamente, mas ainda assim, com a percepção de que está a acontecer Agora. O que pretendo concluir com isto, numa visão muito pessoal, é que a escrita permite que eu esteja a escrever este texto Agora, e que você também o esteja a ler Agora, ainda que possamos estar separados por dias, horas ou anos, entre o momento em que eu o escrevo e o momento em que você o lê. Quanto à percepção subjectiva dos sentidos, também será lógico concluir que cada um cria a sua percepção, conforme a interpretação que confere às palavras e ao sentido que estas tomam para si mediante esta liberdade percepcional que nos foi conferida naturalmente. Esta subjectividade da escrita relacional, quer em sentido, quer em tempo, leva-nos ao grande desafio da verdadeira Escrita Criadora dentro das relações, que é o de conferirmos uma criação que permita conduzirmos as percepções alheias ao encontro da nossa própria percepção, sem conflito, mas antes enquanto meio de manifestação, comunicação e debate dessa mesma criação por meios saudáveis, com respeito à subjectividade das interpretações e percepções.
Mas a Escrita Criadora também pode ter um papel importante enquanto meio de auto-reflexão consciente, mesmo quando esta criação não é partilhada para além de nós mesmos. Quem nunca teve um diário ou um pequeno caderno onde devaneia seus escritos enquanto veículo para este auto-conhecimento e reflexão? Na Escrita Criadora reflexiva, a palavra não se apresenta só como código, mas como liberdade, permitindo ações autónomas, críticas e conscientizadoras, contribuindo para o desejo de aprender, e por consequência, afirmando o estímulo criador, que muitas vezes permite também melhores relações com os outros.
O que compreendemos aqui é que, quer no caso da Escrita Criadora dentro das relações, quer na Escrita Criadora reflexiva, estão sempre envolvidos mecanismos de desenvolvimento, reflexão e comunicação que permitem uma melhor relação com os outros. A escrita é um instrumento de criação do sujeito, tecendo sentidos, e neste potente espaço de criação, o sujeito se constitui na sua relação com a linguagem, e através desta, o indivíduo se vai inserindo enquanto Sujeito e Identidade nas relações com os outros.
Cartas de amor, contratos, missivas com notícias importantes, livros, jornais, revistas, poemas, pequenas ou grandes reflexões, ou mais recentemente, blogs, redes sociais e smartphones, entre outros meios, digitais ou não, são alguns dos muitos exemplos de criação pela escrita, e funcionam enquanto veículos de relação entre milhões e milhões de pessoas em todo o mundo, a pequena ou a grande escala, dependendo do número de pessoas que se relaciona dentro de uma única criação pela escrita.
Jorge Larrosa, um Professor de Filosofia da Educação na Universidade de Barcelona, propõe que o modo de vida dos sujeitos se dá na palavra, pois a experiência vivida e o saber que dela se produz, permite aos sujeitos se apropriarem de suas vidas. Dar sentido às nossas experiências, reflectir, questionar, pensar, é um processo mediado pela palavra. Dar sentido às palavras é dar sentido à nossa vida.
Deste modo, compreendemos que o desenvolvimento das aptidões para melhorar as nossas capacidades de Escrita Criadora, podem ter de facto um papel preponderante na forma como nos relacionamos com os outros e no desenvolvimento da nossa capacidade cognitiva e criativa, assim como na evolução da ação de criar enquanto forma de definir o nosso Eu Sou, ou seja, de encontrar um pouco mais nitidamente e de forma autêntica, o nosso lugar no meio dos outros e em partilha idiomórfica e sanígena com os outros.
Abraço,
Ricardo Moutinho

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